domingo, 30 de maio de 2010

AJUSTE POÉTICO.





- Por favor, onde fica o ponto entre a ingenuidade e a descrença total? Preciso urgentemente encontrá-lo. Não quero ir de um extremo ao outro. Há de existir algo no meio do caminho. Não desejo uma mudança tão radical. Deve ser por isso que caio e levanto no mesmo lugar.
É verdade que já dei alguns passos em outra direção, mas outro dia me ouvi apelando para que alguém me dissesse que vale a pena insistir.
Tem sido assim de uns tempos para cá: A vida mostrando a língua e eu fingindo não ver ou um sonho atrás do outro na fila do despertar.
Acho que essa aura de candura já não me cai bem. Tenho para mim que as roupas também não estão adequadas. Às vezes sinto o desconforto do organdi na pele de menina bem comportada que detestava usar aquele vestido azul marinho.
Em outras lembro o jeans que apertava demais. Alguns vestidos estão muito curtos; outros arrastam a poeira de duzentos anos atrás.
Estou consciente de minha inadequação, mas sem toda coragem para mudar. Mesmo as minhas palavras precisam de ajustes, pois teimam permanecerem na irresponsabilidade poética andando por aí sem documentos, nem regras gramaticais. Umas sem estilo, mas muito queridas por mim, minhas palavras são.
Por isso repito a pergunta com a qual iniciei esse pequeno texto. Existe realmente esse lugar? Se existe aproveite e me diga com que roupa devo chegar.

sábado, 22 de maio de 2010

A Educação Sentimental


Minha abordagem é a de quem se encanta com a escrita cuidadosa, fluente e atraente de Gustave Flaubert.

Em A Educação Sentimental Flaubert lança um olhar irônico, mas também afetuoso sobre sua vida amorosa na França de Luis Felipe. O autor executou pesquisas exaustivas sobre o período historicamente turbulento no qual se desenvolve o romance.

A segunda edição de A Educação Sentimental traz trechos de cartas de Flaubert a amiga George Sand e a outros amigos com vistas a tirar dúvidas sobre acontecimentos da época.

As barricadas, os rumores socialistas e as mudanças de poder formam o pano de fundo para o amor burguês de Frederique Moreau por Madame Arnoux, mulher casada e dedicada à família.

Há um certo cinismo (realismo?) no relato das atitudes ambíguas dos personagens, incluindo Frédérique, uma evocação do próprio autor quando jovem.

O autor ri de si mesmo ao relatar os tropeços de seu protagonista. O medo da concretizar o relacionamento o paralisa. Frédérique ama na impossibilidade.

Entre Roem e Paris, ele avança e recua, sob a regência, aparentemente sem intenção, da mulher amada. A um simples olhar, um gesto apenas, Moreau fantasia e os devaneios guiam seus passos.


Os pensamentos dos personagens são narrados com fluidez; um raciocínio sobrepõe-se a outro com rapidez; a paixão, sempre, ganhando da razão.

Notável é a delicadeza com a qual o escritor descreve os encontros entre Frederique e Madame Arnoux desde o primeiro, no barco, até o último, muitos anos depois.

O romance é um clássico do realismo. É também o retrato que Flaubert, aos 56 anos, faz de sua juventude concluindo que na luta entre os sonhos e a realidade escolheu "o desprezo pelas tentações do mundo e o refúgio nas artes!"

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Pois ao amanhecer toda vida é menina e sendo menina a esperança é infinita.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Enquanto Chove.


Gotas escorrem na janela e para além desta há um céu estranhamente acinzentado. Chove na cidade onde fez um calor medonho nos primeiros meses do ano. Tem um livro nas mãos e o aconchego do quarto. Mas o pensamento se insurge contra a quietude e foge em formas, cores, sensações. A imaginação é rainha dispondo das leis do tempo e do espaço. Ao seu comando todos os muros são derrubados; todas as fronteiras apagadas. Calendários são rasgados. Tudo aqui e agora! Um belo dia de sol ou uma noite enluarada. A tarde, pode até ser uma promissora madrugada. Pés descalços na areia da praia. Pedras de uma cidade antiga. A voz mais bonita ecoa e a vida faz coro. Risos soltos. Sentidos em festa ou mesmo o repouso após a satisfação.Nessa dimensão chocolate quente não engorda. Brigadeiro também não. Tudo pode. Outro olhar através da janela e a mulher acorda. Aquieta-se. Ainda chove.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Tá valendo?



Bem Me Quer.

Tenho para mim que escapar de vez em quando faz bem, afinal quem aguenta viver a cru?
Muitos pregam o contrário, mas duvido que mesmo esses não tenham seus momentos de pura fuga da realidade quando levam muito a sério o quotidiano.
Há muitos refúgios. Uns mais nobres que outros. Outros menos destrutivos que uns.
Desconfio que a vida sem fantasia seja mesmo contra-indicada.
Tenho quase certeza de que precisamos de um filtro para nos manter sãos.
Assim vale dominó na calçada, jogos no celular, um biribinha.
Sei lá.
Um bom romance, um belo poema, uma nova teoria.
Que tal?
Vale uma nova paixão. Vale a meia luz. Vale a criação.
Vale desfiar um rosário, acalmando o coração.
(Ou bem me quer, mal me quer, como distração).
Vale dois ou três chopes e a alegria compartilhada.
Vale um ideal, um cinema e até o sonho de consumo.
Vale a música preferida, para ouvir ou para cantar.
Vale chamar para dançar, tomar um café ou jogar conversa fora.
Só não vale exagerar na dose, jogar areia nos olhos, jogar contra si ou contra o outro, nem trapacear.
Também não vale levar a bola para casa, puxar o tapete do outro, nem se achar o senhor da razão.