quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Crônica de fim de ano.

O calendário marca 27 de dezembro de 2012. Se ainda se usasse folhinhas coloridas nas cozinhas estaríamos a quatro dias de - com certo aperto no peito- arrancá-las da parede.
As imagens sagradas (é verdade que alguns preferiam as mais profanas) ou de lugares paradisíacos teriam o lixo como destino.
O ano passou em uma velocidade absurda entre trancos e barrancos, mas não acabou como queriam os profetas apocalípticos usando a civilização Maia como fonte segura.
Graças a Deus teremos um ano inteiro para arrumarmos a casa para a Copa do Mundo. Teremos festa, sim. 
Em Natal o trabalho será árduo.  A cidade padece as consequências do desgoverno e da falta de vergonha.  Como se não bastasse os descalabros que tivemos que suportar na gestão da prefeita afastada, nos últimos dias a sujeira passou a afrontar nossos sentidos e a nossa dignidade.
Hoje à tarde testemunhei o lixo amontoado nas ruas e noticiado na TV. Havia sujeira até nas imediações do Forte dos Reis Magos, a edificação mais simbólica da cidade. Senti tristeza ao ver canudos usados, cocos verdes, latas e garrafas vazias jogados na passarela que leva à fortaleza.
 Mas meu olhar se desviou na direção da ponte e me deparei com um pôr -do - sol magnífico concedendo uma cor indescritível às águas do Rio Potengi. Do outro lado a Praia da Redinha e atrás de mim a certeza do mar banhando a areia.
A paisagem venceu a ação humana danosa. A esperança ganhou novas cores. Já me animo a arrancar a folhinha e por uma nova no lugar.  Que 2013 venha bonito como essa tarde e se possível passe um pouquinho mais devagar.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

"Não troco minhas esperanças por nenhum reino de Espanha", disse Sancho Pança em Dom Quixote. Nem eu, Sancho. Nem da Espanha , nem de lugar algum. 
Troco um reino qualquer por mais esperanças para mim, para os que amo e para todos que de esperanças precisem para viver e amar melhor, desejando que o real sentido da data brilhe mais que as embalagens e que o amor vença todos os sentimentos contrários. Feliz Natal !

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

A Po-ética da Psicanálise.

Um diálogo com a arte.


“E aquele que não morou nunca
Em seus abismos ... Não foi marcado.
Não será expostos às fraquezas,
Ao desalento, ao amor , ao poema”
Manoel de Barros

A psicanálise conversa com arte desde seu nascimento. Sigmund Freud, seu criador, sorveu e serviu-se da poesia, do teatro e das artes plásticas na construção de sua teoria. Sófocles, Shakespeare, Da Vinci, Michelangelo e Goethe, entre outros, inspiraram, ilustraram e embasaram sua criação.
Freud afirmou que “onde quer que eu vá eu descubro um poeta esteve lá antes de mim”. Foi ele, também, um poeta ao se guiar pela intuição - matéria prima do poeta – ao materializar a teoria que revolucionou o pensamento ocidental no século XX.
Freud deu um destaque especial ao amor, tema maior dos poetas, concluindo que  é preciso amar para não adoecer. Mas foi além ao prever que há amores impossíveis de se realizar e que, portanto, esses amores provocariam a doença quando impedidos. Então vislumbrou a sublimação como outra via de não adoecimento.
Sublimar, segundo Freud, é dirigir a pulsão sexual para outro objeto. Em O Mal – Estar na Civilização ele fala sobre a alegria do artista, que através do trabalho psíquico e intelectual, eleva suficientemente o ganho do prazer ao desviar a libido produzindo arte.
A Psicanálise e a arte continuam entrelaçadas. Hoje incluímos o cinema nesse namoro. A sétima arte mergulha no inconsciente e devolve aos amantes da psicanálise farto material para debate e aprofundamento.
Ao falar em amor falo em desejo, pois amor realizado pressupõe confluência de desejos. Conhecemos a felicidade quando os desejos completam-se. Enfrentamos  desprazer quando os desejos não se encontram.
Pois bem, ame e seja amado. Se houver impedimento tente sublimar fazendo arte. Chore pitangas em verso e prosa. Faça uma escultura. Cante, dance e sapateie. Pinte e borde. Fotografe ou faça um curta metragem.
Ame ou sublime. De preferência, ame. Porém, se não for possível amar, nem sublimar,  respeite o desejo do outro. Afinal, a ética foi criada para possibilitar a paz na ausência do amor. 
Evelyne Furtado, 04 de desembro de 2012.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Uma Página de Proust









Pois bem, eu lia Proust e me despedia de novembro. O livro em questão traz na folha de rosto a data em que o comprei: 10.12.1984. 
A memória resgata a frustração que senti frente ao discurso do escritor francês. Uma pontada no orgulho da leitora voraz que eu era. 
Aí já expresso o motivo da dificuldade. Proust não é leitura para ansiosos. Não é prato para glutões. Muito menos para uma jovem recém-casada, entrando na casa dos vinte anos, estudante de direito e trabalhando dois expedientes.
Para ser honesta, o casamento recente, o trabalho e a faculdade de direito são desculpas esfarrapadas. Na verdade a minha alma alvoroçada e a imaturidade eram os reais impedimentos.
Proust requer paciência, método e muita sensibilidade. O leitor que deseja ação perde-se nas descrições e nas vírgulas do mestre estilístico.
Proust também exige compreensão das diferenças de classe sociais tão  bem detalhadas nas suas narrativas e coragem para mergulhar no mar revolto do inconsciente.
O francês tece  com  delicadeza e precisão  forma  e conteúdo. Vai das firulas do trato social  às profundezas da alma com a mesma precisão.
Bem, eu dizia que lia Proust na madrugada. Hoje me confesso mais paciente e madura. Em meio aos textos acadêmicos que sou obrigada a ler - agora cursando Psicologia- procuro tempo para degustar pelo menos uma página de Proust por dia.
Continua não sendo fácil. Não é o meu escritor preferido. Não sou a ideal leitora de Proust. Permaneço inquieta, ainda, mas vou além das Madeleines e sou tomada por trechos que me tiram o fôlego de tanta beleza. Sou afetada pela luz de Paris e pela surpresa do tempo que volta resgatando o que imaginamos perdido.
Lia Proust  na madrugada na qual dezembro começou. Não sei se lerei outros volumes de Em Busca do Tempo Perdido. Corro para viver o tempo presente, com um pouco mais de calma, como requer Proust e os melhores nacos da vida, mas retorno aos quinze anos onde olhos de dezenove me esperam no portão.