quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Mais Sobre A Paz.




Se dependesse de mim não haveria guerras. Nem briga de rua haveria. É instintiva, em mim, a conciliação. Incomoda-me a desavença entre irmãos.

Não consigo imaginar-me pegando em armas por ideal, amor ou território. Eu não consigo matar simbolicamente uma pessoa dentro de mim, quanto mais tirar a vida de alguém.

Sei por que lutam palestinos e judeus, mas saber não me basta para compreender. Há maneiras de solucionar problemas sem o uso de armas. A morte de inocentes pode até ser justificada, mas nunca aceita.

Perco o freio e falo o que sinto. É verdade. Não finjo, nem calo. Porém, peço desculpas quando me excedo.

Há uma distância enorme entre palavras e atitudes, entre ofensas verbais e tiros, entre dizer e fazer.

Não sou santa. Nem chego perto da santidade. Reajo quando me ferem. Se fosse santa não amaria como amo e estaria na Cruz Vermelha ajudando a salvar vidas.

Aprendo a não carregar culpas que não são minhas, pois com as minhas já lido com angústia. Conheço bem a fragilidade dos meus ombros, que não sustentam as dores de mães desesperadas.

Fecho os olhos às cenas de violência, pois nada posso fazer para evitá-las. Se pudesse faria.

Também não entendo o tal Acordo Unilateral de Paz . Aprendi no curso de direito que acordo exige a convergência de interesses das partes envolvidas.

Assim é na guerra e no amor. Só brigam dois quando dois querem. O amor só prospera quando os dois amam.

Eu torço pela paz em Gaza. Eu busco a paz em meu convívio e quando me vejo envolvida em um conflito que não criei sinto-me mal. Ainda que meu apelo não seja ouvido, faço o que está ao meu alcance nesse sentido. Assim venho conduzindo a minha vida. Assim cuido dos meus. Quantos às crianças da Faixa de Gaza, só me resta rezar.



Evelyne Furtado, 26 de janeiro de 2009.

domingo, 25 de janeiro de 2009

Acordo Unilateral.



Mãos suspensas ante o silêncio
Meu gesto não foi em vão
Sigo em paz e não calo
Liberdade desconhece omissão.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

CONVERSA ÌNTIMA.






"Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira."



- Pare e escute o mar. Lembre-se que o som das ondas quebrando lhe acalma.
- Tá louca? Como vou ouvir o mar daqui?
- Antigamente se ouvia.
- Eu soube disso, mas naquela época não havia tantas construções, nem tantos sons separando as pessoas do mar.
- É verdade, mas o vento...
- O vento eu sinto. Ele está agorinha aqui fazendo festa no meu cabelo.
- Festa? Ele está lhe deixando mais assanhada ainda.
- Quer parar? Só falta dizer que engordei.
- E não engordou?
- Sim, mas não preciso que me digam. Já me basta o desconforto das roupas apertadas. Você queria o quê diante de tanta festa de um mês para cá?
- Calma. Só estou querendo lhe ajudar.
- Me ajudar? Onde você aprendeu que chamar alguém de assanhada e gorda é ajuda?
- É o que todo mundo diz. Aliás, a mídia grita que as mulheres devem ser magras e acabar com os cachos.
- Então a minha briga é com o mundo todo hoje.
- Prefere brigar?
- Às vezes é preciso brigar contra os padrões. Eu costumo lutar muito antes de ceder a certas imposições.
- Então não reclame.
- Reclamo na hora que quiser, tá certo?
- Mas, você precisa se acalmar.
- Preciso sim, mas antes tenho que pensar.
- Você pensa demais.
- Penso mesmo e daí?
- Daí é que você pensa na hora errada.
- Você disse a primeira coisa aproveitável na noite. Eu penso muito antes ou depois. Não penso na hora de decidir.
- Tá vendo? Eu lhe conheço.
- Claro que você me conhece. Você é parte de mim.
- E você vive brigando comigo...
- É. Temos uma convivência íntima e complexa.
- Complexa, não. Tumultuada. Você parece me detestar.
- Não. Eu não lhe detesto. O que eu detesto é essa sua mania de se meter na minha vida.
- Mas eu sou você!
- Você é minha carcereira. Você quer me amordaçar, me prender, me enquadrar. E eu odeio quem tenta me dominar.
- Ah, é? E se eu tivesse me omitido onde você iria parar com suas idéias românticas e libertárias?
- Agora senti até piedade de você. Dei muito trabalho. Fui indisciplinada e afoita.
- Sem falar desse coração melado que você tem e dessa mania de viver no mundo da lua.
- Sinto muito. Eu sofri. Você sofreu?
- Claro que sofri é em mim que dói quando você cai.
- Dói em mim também e muito.
- Essa sua intensidade me assusta, Por isso tento lhe conter.
- Controle eu não suporto. Também não aguento esse seu lado superficial.
- Eu sei. Você nem lê Caras.
- Você é tão metida a séria e não sabe que Caras não se lê. Caras se vê. E eu não gasto dinheiro com bobagens.
- Ah, cadê a moça sem preconceitos e que se diverte com séries na TV?
- Dormindo e não estou criticando ninguém, apenas dizendo que não gosto dessas publicações.
- Pois durma você também.
- Eu quero dormir e sonhar.
- Já disse para escutar o mar. Você adormecia assim quando criança.
- Por falar nisso, viu como o mar estava lindo ontem à tarde? Descansei meus olhos contemplando-o.
- Vi sim. Agora me responda o motivo daquelas lágrimas que beiravam seus olhos em meio a tanta alegria.
- Nem me fale. Eu ainda não sei explicar e você deveria saber.
- Desculpe, mas estava tão emocionada quanto você.
- O vento continua aqui. Você sente?
- Não sinto, mas o vejo balançando a rede e brincando com seus cabelos.
- Assanhando, você quis dizer.
- Não, eu quis dizer brincando, mesmo. Não quero lhe ver triste.
- Jura?
- Juro, eu ouvi aquele seu amigo dizendo que quem a conhece bem não lhe achará feia nunca.
- Ele é tão doce.
- É mesmo. E como eu lhe conheço melhor do que ninguém, não vou mais falar mal de sua aparência.
- Só da aparência?
- Não. Eu prometo não lhe afligir com culpas e medos, desde que você jure cuidar de seu coração.
-Obrigada. Eu juro!
- Que bom, agora deita e dorme.
- Será que terei sonhos bons?
- Isso não é da minha competência, mas que eu saiba seus sonhos estão sendo ótimos ultimamente.
- Estão sim, tenho que agradecer à outra parte de mim.
- Fico feliz por termos nos entendido. Meu trabalho é árduo, mas minha missão é lhe proteger. A da outra parte é mais fácil, pois busca a sua felicidade sem pensar.
- Desculpe, por atender mais fácil aos chamados dela.
- É natural. Acontece com a maioria das pessoas.
- Boa noite, vou me deitar.
- Vá e tente ouvir o mar. Eu falo com a outra para caprichar nos seus sonhos hoje. Soube que tem alguém louco para participar. Vou me fazer de doida e deixá-lo entrar.
-Valeu! Vou acordar feliz e amanhã recomeço a dieta.




"Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente."



* Emprestei versos de Ferreira Gullar do poema Traduzir-se.

sábado, 17 de janeiro de 2009

Transgressão.


Extraindo da pedra o mel
Transgrido na ternura
Meu cinzel.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Beijo.

Bebe o beijo que é teu
Tinto, embriagador, encorpado
Fermentado sob o olhar que me deu.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

BRINCADEIRA DE RODA.



A menina dança e contempla a beleza ao redor. Tirou as vendas que a impediam de olhar a vida, obrigando-a à introspecção.
Seu mundo era cinzento e triste. Foi necessária uma cura profunda e
por um longo período a menina pôs-se a chorar, a gritar, a vomitar.
Convalescendo, segurou outras mãos, recebeu força, devoção. Levantou-se e entrou na roda.
Na ciranda a menina dança e canta. Enxuga disfarçadamente uma lágrima, que ainda insiste em cair de vez em quando, mas já ri com sincera alegria.
Retém consigo as melhores imagens do passado, mas mantém fechada a caixa onde guarda aquelas que ainda não devem ser vista.
No momento há sol, mar, morros, cores, sabores e novas sensações a desfrutar. Por isso menina roda a cantar.



"Como se fora brincadeira de roda, memória
Jogo do trabalho na dança das mãos, macias
O suor dos corpos na canção da vida, história
O suor da vida no calor de irmãos, magia."


Redescobrir, Gonzaguinha.

domingo, 4 de janeiro de 2009

OUTRO VERÃO

Vivo outra vez o verão
De mãos dadas com seus cheiros
Suas cores
Como manda a estação.