segunda-feira, 9 de julho de 2007

Mulher à Beira de Um Ataque de Nervos.



No consultório do analista, Carmem choraminga e diz que não agüenta mais sofrer:

- Não sei mais se ele me ama. Há duas noites não durmo, pois não paro de pensar nisso.

- Você poderia descrever o que sente? Pede o analista.

- Sinto o chão se abrir. Como se fosse acabar a alegria na minha vida e não fizesse sentido mais viver.

O profissional a observa. Ela esboça um sorriso tenso, encobrindo a emoção que sente. Uma sombra se instala sobre seus olhos. Ele fala:

- O que a leva a pensar que a vida não terá mais continuidade? Você é perfeitamente capaz de buscar outros caminhos e sabe disso. Já conversamos muito sobre o assunto.

- Eu sei, mas não posso me controlar. O medo vai aos poucos tomando conta de mim. Preciso desse amor, não sei viver sem ele.

- O que mais me impressiona é ver uma mulher tão inteligente se deixar levar assim pelas emoções. Você tem sangue espanhol minha filha?


- Tenho sim, Doutor. Por que o senhor pergunta?

- Nada importante, mas tive a impressão, olhando para você, que estava diante de uma personagem de Almodóvar. Uma mulher à beira de um ataque de nervos e sem nenhum motivo concreto para se encontrar assim.


-O senhor acha que não é um bom motivo ele não gostar mais de mim?

- Não é não, senhora! Deve ter muita gente que gosta de você e por mais que doa, não é por apenas uma pessoa não gostar de você que você deve desistir de viver.

Ela parece refletir. A sombra permanece no seu olhar. Endireita-se na poltrona, olhando para o psicoterapeuta e indaga:

- O senhor nunca sofreu por amor?

O médico, não parece se assustar com a impertinência, mas leva alguns segundos para responder.

- Não estou sendo analisado, mas posso lhe dizer que já sofri, sim, mas não morri. Você está me vendo aqui.

-Ah, mas eu sou diferente. Disse Carmem, parecendo uma menina mimada.

-Claro que você é diferente, porém tem tanta força como eu. Encontrará uma maneira de lidar com a situação. Eu lhe asseguro.


Ela deixa as lágrimas correrem por seu rosto. Sente-se uma menina abandonada e imagina o esforço que fará para superar mais uma perda.

O terapeuta olha-a e diz que é importante encarar essa possibilidade, mas que tudo pode ser fantasia dela. Ele não enxerga com muita clareza as causa que a levaram a acreditar que o namorado não mais gosta dela. Enquanto o ouve o rosto dela vai se iluminando aos poucos:

- O senhor acha mesmo?

- Acho sim. Espere e não seja tão ansiosa. Pode não ser nada disso.


Agora os olhos de Carmem já brilham de alívio. O sorriso ilumina seu rosto. Pensa que o analista pode ter razão.

O tempo acabou, antes que o terapeuta pudesse dizer que não tinha certeza de nada. Que tudo poderia acontecer. Ele ainda tentou, mas a cliente decidida já se despedia.

Ela sai do edifício com a alma leve e uma expressão inegável de alegria no modo como se dirigia ao seu carro no estacionamento. Dera uma pausa no sofrimento.Ufa!


Evelyne Furtado, 08 de julho de 2007.

3 comentários:

O Amor disse...

Boa noite! Excelente texto. Aliás, não apenas esse. O blog todo é de muito bom gosto e os textos são ótimos. Por enquanto li somente os últimos post (pelo visto o blog andou um tempo abandonado, mas agora parece que as coisas voltaram a fluir por aqui), como faço sempre na primeira vez que visito um blog. Excelentes mesmo! Depois voltarei para ler mais. Estou dando um ‘passeio geral’ pelos blogs relacionados à literatura, principalmente poesia e prosa. Gostei muito do seu blog. Vou adicioná-lo ao meu blog, bem como favoritá-lo no ‘blogblogs’, para que possa visitá-lo mais vezes. Quando puder, visite também meu blog, no endereço: [ http://poemasdeandreluis.blogspot.com ]. Sinta-se à vontade... a casa é sua,... e, gostando,... por favor, também adicione meu blog e ao seu ‘blogblogs’, ‘techinorati’ etc. Vamos tentar ampliar a rede de intercâmbio artístico-cultural, influenciando-nos e aprendendo mutuamente. Grande abraço!

Evelyne Furtado. disse...

André, muito obrigada pela visita generosa. Foi um enorme prazer ler seu comentário! Essa troca é o móbil que me leva a escrever e postar.
Valeu!
Um abraço.

Anônimo disse...

Evelyne, como a tempos eu havia prometido entrei no seu blog. Li, vi e comprovei o que eu já sabia que ia encontrar nesse seu pedaço virtual. Bom gosto, uma escita flúida, com as minúcias femininas que só uma mulher que não mente a idade poderia expôr com tamanha beleza. Boa sorte com os projetos!
Abraço