Custa-me escrever diretamente ao senhor, embora o cite
quotidianamente. Lembro perfeitamente quando ouvi o seu nome pela primeira vez.
Era uma adolescente pouco preocupada com algo além de viver sofregamente o que
a vida me trazia.
Um pouco mais tarde, já na faculdade de Direito, um professor
fez referência ao livro recém-lançado pelo psicanalista Renato Mezan.
Tratava-se de Freud Pensador da Cultura. Fiz meu pai procurar a obra em São Paulo, uma
vez que não estava disponível na minha cidade.
Ganhei o livro e
iniciei aos poucos, de forma não contínua, confesso, a curiosidade e admiração pela
Psicanálise e seu fundador. O livro é precioso, pois além do conteúdo, traz
dedicatória do pai amado com data de 1985. ( _Soa familiar, Herr Doutor?).
Bem, nessa época eu me preparava para ser mãe, e aqui ouso
discordar do senhor: Nada se compara a essa maravilha. Fica clara a minha
incompreensão sobre a sua ( com todo respeito) Visão da Sexualidade
Feminina. Não reconheço a tal inveja sobre a qual o senhor falou. Ser
mãe é o máximo, Dr, Freud!
Porém, o assunto não
é esse e me perdoe por já começar discordando de quem admiro tanto. Mais desculpas pelo tom informal
que vou assumir a partir daqui. É que nasci e me criei muito longe da Bergasse,
19.
Aqui a formalidade é quase zero, portanto não considere meu
tom coloquial um desrespeito, do contrário ficarei sem graça e meu afeto
será recalcado. O senhor compreende? Creio que se esforçará, pelo menos em
retribuição ao empenho que venho empreendendo para entender sua obra tão
complexa.
Voltando ao que interessa, hoje , aluna de sua "tirana" e amada Psicologia, leio , releio e
sublinho como se gritasse "eureca" quando faço uma grande descoberta.
Não domino os seus conceitos . Não li um décimo do que o senhor escreveu. Mas lerei
toda a obra, se Deus quiser. Aqui cometi
outra heresia (aos seus olhos) que me permito, sim senhor. Eu acredito em Deus
e no senhor. Que Ele me perdoe e o senhor não se ofenda.
Como disse acima, não domino os conceitos, mas saiba que mergulhei
no inconsciente com os meus olhos bem fechados. Aprendi tanto sobre mim e sobre
o outro que só Deus sabe o quanto.
Ah, o mundo está uma loucura, Dr, Freud. Há uma gritaria geral, mas não tivemos mais guerras como a última da qual o senhor e sua família foram vítimas. Temos outras batalhas. Outras dores.
A boa nova é que nesse ano do seu 156º aniversário , não existem mais histéricas. Por outro lado sofremos de depressão, ansiedade , fobias e outros males. Os sintomas expressam-se de outra forma, não é?
A boa nova é que nesse ano do seu 156º aniversário , não existem mais histéricas. Por outro lado sofremos de depressão, ansiedade , fobias e outros males. Os sintomas expressam-se de outra forma, não é?
De bom, Doutor, posso
dizer que a liberdade foi ampliada. Todavia, ainda sentimos culpas, medos e
angústias outras. A velha ambiguidade é perene. Continuamos amando, odiando e
recalcando nessa segunda década do século XXI.
O recalque é necessário , mas reconhecer nossos desejos e
sentimentos não tão belos é um alívio. Agradeço-lhe, portanto, pela nova compreensão
do ser humano que alcanço a cada leitura
de seus elegantes e fascinantes escritos.
No mais felicito-o pelo aniversário e aproveito para lhe
comunicar que a causa é vencedora: A psicanálise influenciou toda civilização
ocidental e continua agregando adeptos, apesar dos detratores de plantão.
Com a admiração e o carinho de uma freudiana amadora.
P.S. Espero não ter
cometido nenhum ato falho, o que é frequente em mim. Se o fiz, o senhor
certamente explicará.
7 comentários:
Evelyne,
Acho que Freud teria gostado muito de ler essa carta. Eu adorei.
Beijos
Dolce
Um carinho ao mestre, Dolce, com toda espontaneidade possível diante da enorme admiração. Um atrevimento, rs.Obrigada e beijos.
Bela carta! Acredito que o distinto senhor, lá por cima - se é que existe lá por cima -, está rindo de suas ironias verdadeiras e, com certeza, estudará, especificamente, os itens discordados na sua missiva. Escreveu um lindo texto: suave, intimista e que soa, a quem lê, de voz alta, um tom harmonioso de exposta sessão de análise.
Beijos,
Marcos Eduardo.
Obrigada pela leitura e comentário.
aha!!! lhe achei danada! rsss
beijo grande
vou ficar andando por aqui
Que bom lhe encontrar Yasmine! Beijão!
Love Freud.
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